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Colunas


Pedal Dengoso
por Moacir Henrique de Andrade Carqueja

Data: 15-05-2013

 

Cheguei do Rio na quarta-feira depois de alguns dias sem me exercitar. De noite resolvi dar uma pedalada para queimar alguma gordura, me divertir e garantir um sono profundo. Infelizmente a noite estava muito fria e eu tinha saído pouco agasalhado. Encurtei o passeio e voltei para casa tremendo. Lendo os gráficos do meu computador de bordo vi que a temperatura mínima que peguei foi de oito graus centígrados. Eu nem imaginava que estivesse tão frio quando botei o nariz na rua, bermuda e camiseta não eram trajes adequados.

Passei a quinta-feira relaxado, como se tivesse tomado algum calmante forte. Sentia-me Zen, tão Zen que andaram me buzinando por dirigir devagar demais. Logo eu, um irrequieto impaciente. Na telinha do notebook tinha visto a convocação para o pedal do grupo Duas Rodas no sul da Ilha da Magia e me interessei. Convidei os amigos, mas apenas meu filho (companheiro de todas as aventuras) e Henrique se interessaram pela fria.

Com memória do frio na noite anterior, mudei a indumentária. Vesti o cuecão preto que é uma meia-calça usada sob a roupa de esquiar, com a bermuda de ciclista por cima. Guilherme fez o mesmo. Complementamos a indumentária com camiseta grossa de mangas compridas e um moletom. De reserva levei um impermeável como quebra-vento.

A viagem de casa até o ponto de encontro, posto Macedo do Campeche, me tomou quase uma hora. Não fosse o número exíguo de participantes, eu teria perdido a pedalada. Sendo poucos, os líderes resolveram esperar os atrasados. Coisa rara, afinal aqui em Floripa tudo começa cedo e sempre na hora marcada. Por exemplo... Agora não me lembro de nenhum, deixa pra lá.

Encontrei o Henrique com sua bicicleta nova, já pronto para partir. Ele nos viu com aquela roupa apertada e ficou com inveja. Estávamos agasalhados e atraentes, a mulherada presente não tirava o olho. Claro, eu parecia um bailarino espanhol barrigudinho, enrugadinho, mas emanando a imagem de estar confortável ao frio. Um galã bufo. Só faltava o pompom vermelho na ponta da sapatilha. Ele não resistiu e me perguntou o que era aquilo. Expliquei tudo, até onde se pode comprar, mas dei uma alternativa:

- “Em vez da segunda pele, que é mais cara, podes comprar uma meia-calça de Lycra feita aqui em Floripa, daquelas que as mulheres usam para pedalar ou fazer academia.”

Há uma diferença enorme entre os usos dados a essa roupa. Homens usam as bermudas por cima, as mulheres, às vezes, apenas a calcinha bem marcada por baixo. E ficam maravilhosas! Principalmente as jovens e belas que exibem seus contornos perfeitamente delineados. Dits (fabricante local de fuseaus) seja louvada! Eu não tinha a menor ideia do quanto pode ser sensual um pedal noturno num frio de rachar!

Nosso amigo percebeu que estava mesmo frio e vestiu uma calça de agasalho. Calça frouxa. Depois improvisou com um extensor elástico um torniquete para não enroscar o pano na corrente. Ficou bom, confortável e quase ridículo.

Houve preleção, contagem de participantes, verificação de itens de segurança e largamos.

Eles largaram, porque o idiota aqui resolveu que estava mais frio do que o previsto e fiquei para trás enquanto vestia o impermeável.

Creio que a turma da frente estivesse com muito frio porque os fanáticos puxaram firme para esquentar. Eu saí do posto de gasolina e já nem via onde estavam. Longe. Sendo o mais velho daquela turma eu sabia que minha volada (ou sprint pra quem só fala inglês) é curta, com grande possibilidade de precisar de oxigênio depois, opção indisponível. Tinha que dosar: girar a 90 rpm e manter a velocidade em 30 km/h. Só faltou combinar com os felasdasputa lá da frente, que pareciam estar disputando o Tour de France. Só alcancei a galera quando deram um refresco na Lagoa do Peri. Bem que dizem que quem refresca cu de pato é lagoa. Foi quando pararam para aglutinar o grupo. Eu estava sentindo muito calor, tirei o elmo, depois o agasalho e enfiei na mochila. Quando terminei de me arrumar já tinha ficado novamente para trás. Nem a Ferrari do Massa faz um pit tão rápido. A turma da pedalação precoce já estava a mil.

Minha pulsação estava batendo 160. Nenhum cardiologista aprovaria um sexagenário pedalando por longo tempo nesse regime perigoso. E o cansaço se instalou antes do previsto. Pior, ainda, foi o frio. A roupa que estava por baixo do impermeável estava úmida de suor que se evaporou com o vento aparente gelando o meu cadáver. Comecei a temer pelo sucesso da empreitada. Lá dentro da minha alma eu sonhava com um chuveiro bem quente, uma cama macia e a nêga véia me fazendo cafuné.

Eu fazia companhia a uma moça muito bonita, sou novato no grupo, não sei os nomes ainda, para ajudar com a luz superabundante de meu farol, um exagero de 1.600 lumens. Ela tinha uma luzinha do tipo vaga-lume que precisa de um acessório complementar chamado bengala de cego. Como não dá pra pedalar com a bengala, eu ia ao lado dela dando luz a cego, literalmente.

Então aquele odor adocicado de palha queimada com bosta de cavalo encheu nossas narinas. Era palha da braba, fedida, forte.

- “Eta, futum!”

Com uma bicicleta tradicional, sem marchas, um local pedalava dentro do grupo fumando um charuto de maconha. O doping funcionou, mesmo com aquela coisa pesada, de freio contrapedal, ele nos deixou para trás e sumiu na escuridão. A moça até comentou:

- “Eu não fumo, não bebo, cuido da comida, malho todos os dias e não alcanço esse cara. Será que é a maconha?”

Vai ter muita gente defendendo a tese.

Já estávamos numa estradinha de terra, uma subida pequena, e eu brigando com meu cansaço muito maior do que de costume. Os pneus lisos da Mad Max escorregavam e eu tinha sensação de que cairia a qualquer momento. Mas entre buracos, pedras soltas, sobressaltos e impropérios eu alcancei, com os pulmões saindo pela boca, o ponto de parada, exatamente onde o caminho encontra a estrada do Assopro, que leva ao Ribeirão da Ilha. Nunca fiz aquele trecho de bike, é para os especiais. Em semana de dia das mães nem é bom pensar num trajeto desses, as pobrezinhas não merecem ser lembradas desse jeito.

Pausa para uma água e um papo reconfortante.

- “Tu não és o cara que escreveu a história da queda?”

- “Eu mesmo.”

Pronto, estava descoberto, desnudo. Logo outros que ouviram a pergunta inquisidora se aproximaram.

- “Quem é teu oculista?”

- “É meu amigo Mario Rogerio. Por quê?”

- “É pra eu nunca consultar com ele. Imagina, se tu não vês um caminhão estacionado.”

Apresentei a Mad Max aos presentes com seu guidão pequeno e quatro manetes de freio mais a buzina a ar camuflada.

Feitas as brincadeiras de praxe e as insinuações quanto a minha saúde mental, voltamos ao pedal, agora morro abaixo.

Lá se foram os felasdasputa de novo, saltando pedras, valas e sarjetas no escuro. Eu fiquei para trás para ajudar a iluminar o caminho dos deslumbrados sentindo um frio andino. Só fiquei sabendo o tamanho da gelada quando baixei os dados do computador no dia seguinte: oito graus novamente.

Percebi que o farol da bicicleta de Guilherme era muito fraco e lhe dei o meu reserva que é potente. A juventude é uma dádiva, se desceu o morro no escuro junto com a nata dos felas, sem ver porra nenhuma, agora é que eu não ia mais ver meu guri até a chegada.

O cansaço se acumulava e a sensação de frio se alternava com calor quando eu me esforçava. Seguimos monotonamente pelo piso de asfalto já no caminho de retorno. Passamos por uma moça do grupo que pedalava mais devagar. Passados alguns minutos olhei para trás e não vi suas luzes. Avisei que me deteria a esperar.

Lá vinha a pequenina Julia, mais cansada do que eu, com um lenço enroscado no pescoço passando pelo rosto.

- “Estás bem?”

- “Tou com muito frio.”

Ofereci meu impermeável e ela aceitou sem hesitação. Mas não tinha mais energia para manter o ritmo dos felas. Achei ótimo, eu também já estava pelas tabelas. Havia outro casal de ciclistas à nossa frente e ele, como poderoso e gentil cavalheiro, pousava sua mão nas costas de sua companheira nas subidas, atenuando o esforço dela. A pequena Julia não recebia essa ajuda, eu também estava sonhando com uma mão divina me empurrando que nunca apareceu.

Chegamos. Eu estava quase morto. Rapidamente penduramos as bicicletas no suporte e liguei o carro com o ar no máximo calor. Eu estava tendo tremores, 6,5 na escala Richter. Batia até o queixo e não era de medo.

Banho quente, cama macia, como eu sonhara, mas sem cafuné. Eu não me atreveria a acordar minha mulher de seu sono profundo. Tomei um Paracetamol para combater as dores musculares que apareceram no trajeto de carro para casa e me enrolei nas cobertas.

Tremi a noite toda com calafrios, típico sintoma de febre. Não me atrevi a procurar o termômetro, se a nêga percebesse eu levaria uma mijada inesquecível. Como é que eu me atrevia a sair numa noite gelada e ainda levando o filho dela junto? Para mim era apenas uma gripezinha a mais, não seria problema, em poucos dias já estaria bom.

Desde então tenho estado no estaleiro para reparos. Fui a médico, colhi exames de tudo e não passei no antidoping. Deu presença de traços de cannabis no sangue. Foi aquela catinga lá da Armação.

Diagnóstico: fui presenteado com o que o Rio de Janeiro tem de mais carioca além de samba e arrastão: Dengue.

Agora eu olho a turma pedalando da janela da sala.

Morrendo de inveja.

E com desejo de montar na Mad Max.

 


Moacir Carqueja
Moacir Henrique de Andrade Carqueja
Engenheiro Civil e professor universitário aposentado.Casado, pai de três filhos, residente e apaixonado por Florianópolis.


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