Deprecated: mysql_connect(): The mysql extension is deprecated and will be removed in the future: use mysqli or PDO instead in /home/storage/3/0e/5d/campogrande1/public_html/old/ga-admin/includes/conexao.php on line 18
Colunistas | Campo Grande Net

Warning: Creating default object from empty value in /home/storage/3/0e/5d/campogrande1/public_html/old/template/head.inc.php on line 123
Banner-CGNet-Servsal

Warning: Creating default object from empty value in /home/storage/3/0e/5d/campogrande1/public_html/old/template/head.inc.php on line 139
AACC_ARRAIÁ-AACC_BANNER_510-x-95

Colunas


Noites de Verão
por Moacir Henrique de Andrade Carqueja

Data: 01-02-2012

 

Todo mundo sabe que as noites de verão costumam ser quentes, difíceis para se dormir. Eu nunca morei em Bangu, mas lembro que nos meus tempos de Rio de Janeiro era comum ver no noticiário da televisão qual a máxima temperatura e o local onde ocorrera, quase invariavelmente naquelas paragens. E dava uns absurdos quarenta e poucos graus, a porta do inferno. Acho que foi por castigo que puseram o presídio lá.

Já não basta o bairro ser quente como uma usina siderúrgica, a renda per capta da população é das mais baixas. Desgraça pouca é bobagem. Imagine um infeliz morador local, distante do centro da cidade, ainda tem que conviver com sua baranga, praga que o seu maior inimigo pediu ao onipotente que lhe desse. Talvez tenha pedido ao diabo mesmo. Então é assim: pobre, morador de uma casa que é um forno e que dorme com uma modelo de artigos para Halloween.

O coitado volta para casa depois de uma demorada viagem de trem, que é onde transpira pelo pão de cada dia e faz um blend sudorífero com seus companheiros de vagão. Não tem esse problema no serviço porque é auxiliar de escritório e trabalha em ambiente climatizado. Sua esposa tem escrúpulos, não se propõe a beijar um homem com odor de chucrute.

- “Vai tomá um banho e depois vem pra mesa.”

O maridão obedece e sai do chuveiro só com a calça curta do pijama, pingando pela casa.

- “Tu tá molhando tudo! Não sabe se enxugá?”

- “É pra ficar mais fresquinho. Tá calor.”

O sujeito senta e come o feijão com arroz observando a novela e esperando pelo futebol que não tem em janeiro. Por fim se joga na cama, cansado e úmido, mas agora já é de suor. Não há brisa no bairro; os telhados, o asfalto, as paredes, tudo, irradiando calor. A sensação é de estar dentro de um forno que foi apagado há pouco. O suburbano abre uma nesga na janela na esperança de alguma ventilação, mas a calmaria reinante não sopra o alívio. E a mulher reclama.

- “Fecha isso aí, os vizinhos vão ficar me espiando.”

- “Não se iluda, mulher, ninguém se interessa por isso aí.”

O diálogo me fez lembrar um episódio de muitos anos passados, quando eu tinha um fusquinha velho e acabara de fazer as compras de supermercado do mês. Ali dentro repousava representativa parcela de meu mirrado salário. Parei o carro na rua onde estacionava todo dia para trabalhar, ainda tinha que comprar peixe no mercado, e o flanelinha, velho conhecido, se aproximou. Fiz minha recomendação:

- “Cuida bem do meu carro porque tem muita coisa dentro.”

O moleque examinou o conteúdo de minhas provisões mensais e vaticinou:

- “Quem é que vai querer isso daí?”

Acho que eu tinha em comum com o banguense o fato de comer mal. Já revi meus conceitos, melhorei muito, deixei de ser vegetariano, mas isso é mais fácil do que o suburbano passar sua mulher para frente. Principalmente se ela for algum tipo fugitivo de São Jorge.

Naquele vapor pegajoso da atmosfera da alcova o coitado liga o ventilador e joga no chão a única peça e roupa que estava vestindo, pois cada centímetro quadrado de tecido incomoda. Deita-se de costas, pernas e braços abertos para aumentar a área exposta ao vento supostamente refrescante. Mas o sopro do aparelho serve para se imaginar o que seria um vento solar, coisa que sempre aparece nos filmes documentários que ele assiste na TV, mas nunca sentiu.

Em outra área da cidade um indivíduo da classe média alta dispõe de ar-condicionado no quarto e pode se dar ao luxo de ter temperatura de montanha no verão carioca. Mas essa maravilha tecnológica cobra seu preço para quem tem rinite: o nariz entope. Assim é que muita gente boa prefere o velho ventilador e a janela aberta, apesar dos protestos da baranga titular.

Outra coisa importante na vida dos casais modernos é o tamanho da cama. Antigamente a parelha dividia um metro e quarenta de largura, que era suficiente, dada a paixão da juventude eles só dormiam em conchinha. Depois veio a artrose e com ela a cama queen-size, um metro e sessenta de vastidão. Já na idade mais avançada o ideal é a king-size, aquele latifúndio acolchoado onde a vizinha se situa a duas léguas de prudente distância, suficiente para que o ventilador consiga espalhar os gases provenientes tanto do sótão, como do porão. Pois é assim na prática, não há escovação que repare o hálito da velha, nem Luftal que amenize as emanações do biodigestor lindeiro.

A cama larga permite trégua nas batalhas de todas as noites por território. Há o suficiente para ambos e até se tem o luxo de prescindir área para terra de ninguém, como nas guerras de trincheiras. Mas ainda não se escreveu um armistício para a luta silenciosa pelo controle remoto. Contudo, há uma vantagem em se dispor dessa faixa de lençol sem dono, ali se pode alojar estrategicamente o aparelho que a pose define quem é o cabeça interino do casal. Se o marido ronca de atrapalhar o sono, ela se vinga ligando a televisão bem alto na reapresentação de um jogo em que o time dele levou uma surra.

O verão é também o tempo da libido, certamente que seu apetite sexual estará mais aguçado, sua vontade será tão maior que você será capaz de comer a baranga vossa de cada dia e achar tão bom quanto a amante. Aproveite a tesão, mas o “silêncio do depois” (saudade de Vinícius de Moraes) vai ser uma ressaca de corpos suados e pegajosos. É quando vem o sono dele e a insônia dela.

Agora o corpo relaxa, a realidade começa a se misturar com a fantasia, o sonho chega imperceptível, uma delícia que é cruelmente interrompida pelo zumbido das asas de um mosquito. Você tenta uma postura Zen, finge ignorar que ele existe, mas é impossível. Esse mísero ser sabe todos os truques para lhe acordar e estragar sua noite, aferroa em lugares sensíveis, zumbe no seu ouvido e, sublime crueldade, chega a lhe penetrar nas ventas. Segundo uma pesquisa feita por um notório psicólogo do comportamento humano, todas as pessoas que se lembram de um mosquito dentro de suas fossas nasais coçam o nariz. Portanto, fique à vontade.

No dia seguinte o insone compra um daqueles aparelhos que liga na tomada e enche o quarto de um odor insuportável. O vendedor garante que é tiro e queda. Depois de três noites seguidas com as sirenes de alarme de bombardeio aéreo ligadas o infeliz conclui que aquela catinga eletroquímica é excelente para engordar a mosquitada. Chega ao trabalho com cara de flamenguista depois de perder pro Vasco e tem que se explicar:

- “Tem uma esquadrilha de mosquitos que não me deixa dormir.”

- “Liga o ventilador no máximo em cima de ti. Essa eu garanto.”

Mas já não fazem mais insetos como antigamente. Eles estão bebendo o sangue de marombeiros e recordistas mundiais, estão tomando anabolizantes indiretamente e estão superbombados. Já não é qualquer ventinho que cansa a bicharada. O zumbido que agora se mistura ao ronco das ventilantes turbinas parece conter um grito de comemoração semelhante aos das pessoas em vertiginosa queda numa montanha-russa. Eles adoram.

Se o maridão foi escoteiro vai se lembrar dos repelentes para mosquitos, mas aí esbarra na patroa que não quer que fronhas e lençóis fiquem engordurados por qualquer substância que não os seus cremes faciais. Tenta ainda a solução tóxica de borrifar um veneno inseticida pela casa, mas os danadinhos evoluíram com a tecnologia, tenho uma teoria que eles usam máscara para gases que são muito pequenas para serem vistas a olho nu.

Contudo a noite infernal passa, os desprezíveis mosquitos ficam saciados e se recolhem para algum abrigo invisível. Então a madrugada fresca convida ao sono reparador. É momento delicado e perigoso, muitas mulheres já morreram por acidente provocado pelo marido quando inadvertidamente executa arremesso de relógio despertador.


Moacir Carqueja
Moacir Henrique de Andrade Carqueja
Engenheiro Civil e professor universitário aposentado.Casado, pai de três filhos, residente e apaixonado por Florianópolis.


    Compartilhe


Outras Colunas


>> Carteira Assinada

>> Pedal Dengoso

>> Orgia noTemplo

>> A Queda

>> Dois Tarados Pedalando

>> Fé na Ciência

>> Só me faltava isso.

>> A Serviço dos Ianques

>> Escala de Tombos

>> Mad Max

>> Vestido de Noiva

>> Lista para 2013

>> Natal do fim do mundo - 2012

>> Vítimas de Newtown

>> A Amásia Lobista

>> Julgamento do Bruno

>> Corrida Matinal

>> Segurança no Condomínio

>> Aos que pensam que Cuba é ruim

>> Entregando Pizzas

>> Primeiro Michê

>> Aumentando a Frequência

>> Carango Baratinho

>> Bota a Camisinha

>> A Morte do Erotismo

>> Ata de Reunião

>> Vaso Entupido

>> Mais cotas.

>> Carioca na Campanha

>> Estatísticas de Orgasmos

>> Doutor do Boi de Mamão

>> Encontro na Varanda

>> CPI dos Holofotes

>> A Tiazinha

>> Toc-toc

>> Negociando no Congresso

>> A Cunhada do Wronsky

>> Ah, Espelho Meu...

>> Mamãe vai às compras

>> Meio Século de Espera

>> Matei um Monte

>> Malandro é Malandro

>> O Zelador

>> Hora de Pendurar as Chuteiras

>> Ossos do Ofício

>> Ambulância

>> Bloco de Sujas

>> Wando

>> Censura às Idéias

>> Vício

>> Recordista de Abates

>> Previsões de Carquejamus para 2012

>> Ressaca da Despedida de Solteiro

>> Natal 2011

>> Despedida de Solteiro

>> Festinha Adolescente

>> Cidadania italiana postergada

>> Lei Seca

>> Cidadania italiana

>> Palestra de Prostituta

>> A Prova do ENEM

>> Prorrogação

>> Inspeção sanitária

>> Porta-voz divino

>> Automóveis

>> Bolero

>> O Namoro de Dona Zilda

>> Chutando fora

>> Arquiteto Afeminado


Calendário

«Maio - 2024 »
DSTQQSS
   1234
567891011
12131415161718
19202122232425
262728293031 

banner-Ópitica_do_Divino



O portal da Cidade de Campo Grande. Informações sobre os acontecimentos da Capital de Mato Grosso do Sul; cultura, lazer, gastronomia, vida noturna, turismo e comércio de Campo Grande.