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Colunas


Matei um Monte
por Moacir Henrique de Andrade Carqueja

Data: 19-04-2012

 


A happy hour já estava alongada noite adentro e os marinheiros de prosa e verso estavam pilotando seus copos à beira do mar em Jurerê. Haviam enfrentado com brios e estoicismo o inimigo comum de todos os veranistas, desde o Oiapoque ao Chuí, a música alta, em geral ruim, no caso presente um pagodeiro de fim de sábado oficialmente contratado pelo Iate Clube. Agora a banda já estava desligada e eles podiam conversar como pessoas civilizadas sem ter que gritar e competir com os Watts dos amplificadores.

Os navegadores de verdade iam chegando da faina, da terapia libertária de angústias, executada no mar naquele dia maravilhoso de janeiro, caminhando pelo trapiche com andar cansado, a pele torrada pelo sol e o semblante demonstrando que o paraíso existe e fica em algum lugar ao norte dos Naufragados e ao sul da Ponta das Laranjeiras. Devo acrescentar, concordando com muitos leitores e evitando as suas respostas indignadas, que outros paraísos existem, por exemplo, ao norte de Santos até Cabo Frio. Entre os que arribavam estava Marciano que se mostrou alegremente surpreso de encontrar a corriola de sempre, só que na subsede do clube.

Roda estava com a tabuleta ligada e logada na rede, ávido de notícias, e fez um comentário quando cumprimentou o amigo:

- “Oi, Marciano, tudo bem? Acabo de ler uma notícia de um soldado americano que declara ter matado 255 pessoas como atirador de tocaia. Quantos já matasse?”

- “De tocaia, nenhum.”

Loiola vociferou revoltado.

- “Como é que alguém pode se gabar de matar um semelhante? Isso é crime de guerra, mesmo em guerra.”

Roda respondeu com deboche no tom da fala.

- “Tu ainda te preocupas com gente... Conheço pessoas que não se importam com isso, mas se virem alguém chutar um cachorro correm pra delegacia.”

- “Ainda bem que a Bete não está aqui, ela ia pular em ti e, provavelmente, te morder, gosta tanto de um cão que chega a pensar como eles.”

Loiola voltou-se para Marciano.

- “Disseste nunca ter matado alguém de tocaia. E de outra forma?”

- “Só matei formigas, ratos, moscas, mosquitos e pererecas.”

Roda continuou com suas observações ácidas.

- “Tem bicho que ninguém tem pena. Os ratos podem ser envenenados, sofrem mortes horríveis e achamos natural, mas se um cachorrinho de madame comer uma isca com raticida, quem estiver desratizando vai se dar mal. Pobre cãozinho infeliz, morto cruelmente por um desleixado inconsequente.”

Marciano concordou com um aceno, mas o interlocutor não parava a fala.

- “Marciano, todos esses bichos incomodam, menos os sapos e pererecas, por que mataste, então?”

- “É uma figura de linguagem, matar uma perereca é como dizer que tem uma parceira sexual nova.”

Loiola gostou da abordagem. Chamou o garçom.

- “Traz mais duas geladas e um copo aqui pro doutor Marciano!”

Repentinamente o grupo focalizou os ouvidos no matador de batráquios.

- “Aê, conta pra nós quantas já mataste. Perdes ou ganhas do atirador de elite?”

- “Nunca fiz essa avaliação.”

- “Pensa um pouco, computa, e fala.”

Roda pegou sua tabuleta (tablet para os anglófilos) e se propôs a abrir uma planilha eletrônica para ajudar no cômputo.

- “A minha primeira foi no tempo do segundo grau, com a minha prima Carmen nas férias.”

Silvio, amigo desde a infância, fez um comentário amargo.

- “Peraí, Marciano, eu sei de pelo menos duas vezes com o Julinho, aquele teu vizinho, que me contaste que todo mundo no bairro comia.”

Marciano perdeu a compostura, ficou vermelho, não sabia o que dizer. O detratante prosseguiu na sua leviana acusação.

- “O Julinho se mudou para o Rio e ficou rico, mas morreu de AIDS, foi um dos primeiros brasileiros a pegar a doença, dizem que foi numa viagem a Nova Iorque.”

- “Pô, Marciano, matasse uma cobra, não uma perereca.”

- “É cascata do Silvio, na verdade ele foi quem me disse que o Julinho era disponível.”

Passos, frequentador bissexto do grupo, intercedeu com ar sacana:

- “Roda, bota aí na lista: Julinho. Já temos duas execuções.”

Marciano ia falar, mas percebeu que tinha um problema. Refez a frase mudando que ia dizer.

- “Acho que nós deveríamos parar por aqui, isso vai deixar muita gente aqui em má situação.”

- “Troca os nomes, então.”

Roda fez uma observação inteligente.

- “Ora, a graça reside na exposição da pecadora, queremos saber, sim.”

- “Tinha a Maria Clara, empregada da minha avó.”

Silvio deu uma gargalhada.

- “Ela era casada, eu me lembro. Era ajeitadinha, uma alemoa lourinha e de olhos azuis. Se dessem um banho de loja na guria ela seria disputadíssima, mas eu nunca imaginei que tu poderias estar desfrutando dos carinhos dela.”

- “Durante todo o tempo da faculdade eu aproveitava que a vó fazia a sesta. Só que um dia a velha acordou mais cedo, tinha se esquecido de tomar os remédios que davam sono, foi chamar a Clara e me pegou no chuveiro com ela.”

Loiola fez sua pergunta acusativa.

- “Conseguisse deixar tua avó sem a empregada?”

- “Mais ou menos, a velha me disse que precisava muito dela e que eu estava proibido de almoçar lá.”

- “Nada como a sabedoria dos mais velhos.”

- “Mas ela se demitiu, e me ligou dizendo que, se não podia me ver, não interessava mais o emprego.”

- “Amor de pica, quando bate fica.”

O grupo estava realmente excitado com as firulas que a existência do amigo executava, mas Roda permanecia atento ao objeto.

- “Não podemos nos afastar do assunto da conversa, o número de abates do nosso herói masculino.”

Visão machista, porque para as feministas todo homem galinha não passa de um vilão. Só as mulheres felizes e resolvidas, que tenham atingido a serenidade, conseguem compreender essa vertente maravilhosa da psique masculina. Nelson Rodrigues dizia que as mulheres gostam de apanhar, mas só as normais, as neuróticas não. Eu acrescento que quando essa neurose chega à loucura elas se tornam feministas.

Já contavam mais de trinta execuções quando surgiu vindo do trapiche, um antigo amigo de Marciano que não era sócio do Veleiros, mas do Iate Clube do Rio de Janeiro, o Pereira. Visita inesperada, ele chegava por mar após uma semana de travessia desde Ilhabela parando em algumas praias. Marciano o recebeu festivo, com exagerado abraço e tapas ruidosos nas costas ardidas do marujo. Depois o apresentou ao grupo.

Pereira olhou intrigado para a planilha eletrônica sobre a mesa, olhar que foi percebido por Roda.

- “Estamos fazendo um levantamento de quantas pererecas o Marciano já matou. Podes contribuir com algum abate registrado?”

O carioca era rápido no pensamento.

- “Pererecas significam xanas?”

- “Isso, e temos que colocar os nomes na planilha com as datas aproximadas para ajudar na lembrança.”

Recitou vários nomes e datas que se adensavam entre os vinte e os trinta anos de idade do algoz. Pereira gostou da brincadeira, pediu uma cerveja e começou a fazer exercício de memória.

- “Como é o nome daquela mulher que era casada com um amigo teu? Um lance que você me contou uma vez, depois de uma regata lá no Rio, acho que foi em 91.”

Marciano estava nitidamente contrariado com aquela revelação repentina, tentou negar.

- “Nunca te falei isso, estás enganado.”

O interlocutor parou para pensar, fez um esforço de concentração.

- “Já esqueceu? O nome dela era Ma qualquer coisa... Mathilde, e você até me contou que o marido nunca ia desconfiar, ele tinha uma empresa de importação e viajava muito.”

Fez-se um silêncio sepulcral.

Marco Passos levantou-se e se afastou sem se despedir ou pagar a conta, tinha o semblante transtornado. Só quando ele desapareceu a caminho do estacionamento que Roda comentou.

- “Porra, Marciano, tu não livraste nem a Mathilde? Mesmo sendo mulher de um amigo?”

- “É, pisei na bola. Foi um lance de uns dois anos, ela que me procurava.”

Notava-se claramente que o grupo estava desconfortável. Pereira percebeu.

- “Esse cara que saiu zangado era o marido?”

Roda olhou fixamente para ele por algum tempo.

- “Não era. Ainda é.”


Moacir Carqueja
Moacir Henrique de Andrade Carqueja
Engenheiro Civil e professor universitário aposentado.Casado, pai de três filhos, residente e apaixonado por Florianópolis.


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