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Bloco de Sujas
por Moacir Henrique de Andrade Carqueja

Data: 23-02-2012

 


Marciano se preparou para aquele sábado de carnaval na Praça XV. Iria de bailarina, com saiote de gaze verde e peitilho branco. Comprou uma peruca loura, meias tipo arrastão e um par de sapatilhas. Depois foi para a casa de Reinaldo Ferrari, velho conhecido desde seus tempos de estudante. Não eram íntimos, nem podiam se dizer verdadeiramente amigos, seus contatos decorriam de encontros casuais no mercado público para uma cerveja e um bolinho de bacalhau. E foi lá que Reinaldão o convidou para o carreteiro que seria o esquenta, com muita caipirinha, muitas mulheres de acompanhantes, para o desfile do Bloco das Garanhonas.

Reinaldo era líder e fundador daquele grupo e dizia que o nome tinha sido escolhido por ser ele um renomado garanhão que tinha tudo a ver com seu apelido italiano, Ferrari, cujo símbolo é um cavalo.

Uma charanga havia sido contratada para animar a galera, batuqueiros de todos os Grêmios Recreativos da cidade estavam presentes em troca de cem reais por cabeça. Um carrinho de sorvete cheio de gelo e latinhas, outro com guaraná e uísque, faziam a retaguarda guardados por quatro seguranças para desestimular o saque e desencorajar pedintes. Só podia se abastecer, mas quantas vezes quisesse, quem tivesse credencial do bloco. Depois tudo isso seria contabilizado e dividido pelos participantes.

Reinaldão é vaidoso, gosta de postar suas fotos de sunga no Facebook montado na sua motocicleta, cuida do físico malhando em academia. Há uma delas emblemática, em que ele aparece sentado numa cadeira de praia diante do mar de Jurerê. Separou-se recentemente da esposa, um casamento de mais de vinte anos, alegadamente para cair na farra.

- “Cansei de comer o mesmo prato sem tempero todos os dias. Agora eu quero variedade.”

A verdade é que pouca gente o tem visto com mulheres naquela atitude de quem está tendo algum caso, tem saído com belas fêmeas, tem estado sempre em companhia de coroas apetitosas, mas a discrição é sua marca, dessa forma, algumas aleivosias quanto à sua masculinidade podem ser eventualmente ditas. Apesar das declarações de que queria comer todas as mulheres de Floripa, arranjou uma namorada fixa bem mais jovem do que ele. Ela é reservada e destoa completamente do espírito espalhafatoso e festeiro do seu par. É sabido que ele gosta de organizar pequenos encontros para saborear alguma comida exótica e beber vinhos, onde altas gatas costumam ser convidadas. Até o porteiro do prédio situado em frente à sua casa comentou um dia:

- “Seu Reinaldo, o senhor tá levando cada gata pra sua casa que dá água na boca. Ah seu eu tivesse grana como o senhor! Deus o benza! Que continue aproveitando a vida!”

Reinaldão só ria, curtindo a fama que conquistava no dia a dia.

Como dito, é vaidoso e, além do corpo cultivado em academia e algum laboratório químico, gosta de manter seus cabelos grisalhos sempre bem cortados e penteados e curte uma barba de mesma cor do escalpo primorosamente aparada de março a dezembro. Em janeiro raspa a face, porque vestido de mulher não combina com barba, e gosta de ter o rosto bronzeado.

- “Se é pra me vestir de mulher, tem que ser no capricho.”

Certa ocasião, Marciano até indagou sobre a necessidade daquele cuidado extremo:

- “Ferrari, tu não estás perdendo o foco? Se o objetivo é se divertir, fazer uma caricatura de mulher, não seria mais engraçado de barba?”

- “Nêgo, a caricatura está na busca da perfeição, as mulheres sempre se acham bonitas, temos que imitar.”

Marciano não entendeu a explicação, deixou rolar como se tivesse compreendido, era melhor do que iniciar uma discussão estéril.

O arroz de carreteiro estava uma delícia e muita gente passou dos limites, tanto no garfo, quanto no copo. Lá pelas quatro da tarde a turba se considerou aquecida e ganhou a rua, descendo pela Chácara de Espanha. Dali, seguiu ladeira abaixo em direção à Praça XV, palco de tantas glórias, tantas infidelidades, tantas revelações, tantos homens saindo do armário.

Pelas calçadas caminhavam algumas das mulheres que não pretendiam entrar na folia, mas que tinham como principal objetivo vigiar maridos e namorados. Segundo voz corrente na ilha da magia, que no carnaval é promovida a ilha da putaria, homens travestidos no embalo de Momo podem se mostrar inseguros e terem a necessidade imperiosa de agarrar alguma mulher, o que qualquer inspeção visual ao palco da folia demonstra sem dificuldades. Mas existe outra faceta dessa brincadeira com roupas do sexo oposto, alguns se empolgam com a fantasia e se entregam a grandes amassos publicamente. Um indivíduo bastante alcoolizado se aproximou de Marciano e tentou agarrá-lo, mas ele se esquivou.

- “Que é isso, mina, vem aqui dar uma beijoca no Jorjão, vem sentir como eu sou bem dotado.”

- “Sou lésbica, só gosto de mulheres.”

- “Oh, que pena.”

Marciano tratou de se evadir dali, sempre tem gente que não consegue identificar as diferenças. Um colega de trabalho, certa vez, lhe dissera que é fácil saber quem é homem e está se divertindo e quem é viado e está soltando a franga.  

O amigo Roda também estava presente em trajes de mucama. Era um saiote negro curtinho, que contrastava com uma calcinha de cetim verde, uma camisa também negra e um avental branco. Na cabeça uma tiara branca completava o traje, que tinha mais oito amigos de fantasias iguais. Roda se divertia com uma vassoura de piaçava na mão, que usava à guisa de estandarte, e dizia para as mulheres que assistiam a bagunça:

- “Você não quer me dar um emprego pra eu cuidar do seu marido? Ele vai gostar e você pode ficar tranquila, eu sou pobre, mas sou limpinha.”

Vestido de bailarina espanhola, de saia vermelha e negra, com castanholas nas mãos e uma peruca de cabelos lisos e pretos, vinha Reinaldão. Até o sapato de salto curto típico da dança flamenga ele tinha encomendado. Sua indumentária estava perfeita e, na frente do Palácio Cruz e Souza, atraiu a atenção de um operador de câmera de uma emissora de televisão e seu repórter acompanhante.

- “Como você está lindo! Como se chama?”

Com voz propositalmente afetada, com gestos exagerados, ele respondeu muito bem humorado:

- “Linda, meu bem, linda. Eu me chamo Reinaldo, mas pode me chamar pelo meu nome de guerra, Carmen de Sevilha.”

O entrevistador deu um sorriso.

- “Legal, Carmen, desculpe. Onde você conseguiu essa roupa?”

- “Eu mandei fazer especialmente, eu tenho uma amiga que é espanhola e ela me deu algumas dicas. Embora tenha sido feita em Floripa, todos os tecidos e adereços são importados, então é uma roupa autêntica.”

- “Você é casada?”

- “Solteira, mas eu tenho namorada que está me olhando ali na calçada.”

- “Podemos chamar ela aqui?”

- “Marisa, vem cá!”

Mas a namorada se negou a aparecer, sorrindo fez um sinalzinho agitando o indicador no conhecido gesto que significa não e desapareceu no meio do populacho.

- “Acho que sua namorada está com vergonha. Ou será que ela te abandonou por causa dessa roupa?”

Reinaldo resolveu fazer piada.

- “Pode ser, se ela não me quiser eu mudo de lado.”

- “O que você acha desse rapaz para seu namorado?”

O repórter segurou pelo braço um indivíduo que passava e estava fantasiado de boy stripper, usava sunguinha, uma coleira vermelha no pescoço, uma cartola negra e pulseiras tipo ginasta, também vermelhas. Ele era claramente um fisicultor, ostentava um monstruoso bíceps com mais de 40 centímetros de anabolizantes.

O rapaz se chegou.

- “Posso te apresentar a Carmen de Sevilha? Ela está procurando par.”

Ato contínuo os dois se abraçaram e fingiram estar se beijando na face, ou assim parecia.

O repórter agradeceu a participação de ambos e foi em busca de outra vítima.

Entrementes Marciano vinha sambando e mexendo com as mulheres da calçada em companhia do amigo Roda, que comentou ao ver a entrevista:

- “Marciano, agora eu tenho certeza, o Reinaldão é uma bichona!”

- “Que é isso, cara, estamos todos só brincando.”

- “Mas ele é muito afeminado, muito exagerado.”

- “Olha em volta, todos são exagerados, os homens viram o rabo pra quem passa, é só uma brincadeira, uma alegoria.”

- “É, mas ele tava dando beijinhos no grandalhão.”

- “Todo mundo aqui tá fazendo isso.”

- “Mas precisa dar selinho na boca?”


Moacir Carqueja
Moacir Henrique de Andrade Carqueja
Engenheiro Civil e professor universitário aposentado.Casado, pai de três filhos, residente e apaixonado por Florianópolis.


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